sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Indigenista Wagner Tramm esclarece melhor o que aconteceu no 4º Congresso do PT

O indigenista Wagner Tramm traz uma versão mais completa dos acontecimentos que se deram durante o 4º Congresso do PT, em relação à participação de um grupo indígena e de membros da Condsef.


Eis seu relato:


Caros companheiros Indigenistas,

Na verdade a participação no 4º Congresso do Partido dos Trabalhadores e as manifestações de repúdio ao Decreto Presidencial, etnocida, nº 7056/09, contra os atos do presidente da Funai e a ingerência das ong's no órgão indigenista não foram ações exclusivas dos índios e/ou militantes do Partido dos Trabalhadores, conforme consta no blog do Mércio Pereira Gomes.

Lá estava presente o grupo de índios integrantes do chamado movimento indígena revolucionário (Kraô, Pankararu, Kaingang, Xavante, Munduruku e outros)  que se encontram acampados na Esplanada dos Ministérios ainda que privados de abastecimento d'água e de alimentação por conta de posições ideológicas contrárias ao que acontece atualmente com os índios e indigenistas;  constavam ainda servidores da Funai, a representação do Sindsep-DF, no órgão indigenista apoiados pelo sindicato, pela Condesef e pela CUT.

Praticamente invadimos o congresso no seu segundo dia de realização já que não estávamos credenciados a participar nem como observadores, como tentamos de início.

A nossa presença ostentando duas faixas com os dizeres: "Abaixo a ditadura do Decreto 7056/09" e Fora Márcio Meira e as ong's CTI e ISA que ora subjugam os povos indígenas ", não foi pacífica como parecer ser! Houve muitas confusões e desentendimentos contrários a nossa presença. O militante do partido, Paulo Okamoto, presidente do Sebrae, num ato reacionário, estridentemente pedia a nossa saída e a retirada das faixas. Neste momento, perguntei-lhe em alto e bom som se o congresso era "racista".

Apoiado pelo Deputado Estadual -GO, Mauro Rubem, e por outros manifestantes adquirimos o direito de manter as faixas levantadas e permanecer no local que estávamos, não obstante as constantes ameaças dos seguranças no sentido de nos retirar do local.

No decorrer do evento, várias vezes as duas filhas da Lúcia Munduruku, lideradas pela irmã de nome Suami Muduruku, tentaram furar o bloqueio da segurança para entregar uma carta ao presidente. Depois de mais cinco tentativas elas conseguiram, mas retornaram sem uma resposta para o pedido de audiência com o presidente ou uma manifestação a respeito da carta que lhe entregaram.

Em seguida começamos a gritar: “LULA O ÍNDIO QUER FALAR!” e " FORA MARCIO MEIRA JÁ ! "

Inúmeras vezes um representante do gabinete do presidente, denominado Mauro, esteve junto ao nosso grupo garantindo que o presidente iria nos receber.

O presidente Lula ao iniciar o seu discurso reconheceu a legitimidade da manifestação e retoricamente garantiu que resolveria o problema na semana seguinte.

Os ânimos se acalmaram e entendendo ter transmitido a nossa mensagem, deslocamo-nos do centro do corredor onde estávamos para a lateral esquerda do auditório no sentido de quem entra, onde estava parte da imprensa. Lá iniciou-se um novo conflito : os seguranças alegavam que o espaço era destinado a imprensa, mas continuávamos com as nossas faixas estendidas. Mais uma vez o Sr. Mauro se dirigiu ao nosso grupo alegando que o presidente Lula iria ao final nos receber.

Quando chegávamos ao  citado local um senhor que se dizia ex deputado e prefeito de uma cidade baiana se desentendeu com um pajé Pankararu, um segurança interveio rispidamente aí a índia Lúcia Munduruku o agarrou pela gravata e exigiu respeito aos direitos indígenas dizendo que a atitude dele era racista! Logo depois que o pajé conseguiu passar pelo bloqueio e se reintegrar ao nosso grupo o prefeito baiano pediu desculpas e se identificou... continuamos com as duas faixas estendidas durante todo o tempo.

Durante o almoço fomos recebidos gentilmente em nossa mesa pelo Dr. Perly Cipriano, Subsecretário Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos que pacientemente ouviu as reclamações do grupo com referência a presença da Força Nacional na porta da Funai, portando escudos, cassetes e armas de grosso calibre com se estivessem preparados para uma guerra, impedindo a entrada dos índios e de pessoas do povo como é o caso dos servidores das administrações regionais extintas: Alexandre Krone, Stela Barnes, Waldira e Paulo de Recife; da aposentada Ana Lange; do representante da Condesef, Sérgio Ronaldo e tantos outros. Com relação à violação da convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho. A respeito da ausência de diálogo com os órgãos de governo (ministério da justiça e gabinete presidencial) apesar dos inúmeros pedidos de audiência sem resposta. Sobre a atuação das ong's ,CTI, ISA, IEPE e  outras cujos representantes e familiares ocupam cargos estratégicos no órgão indigenista em detrimento das organizações indígenas que o presidente e sua direção alegam que foram consultadas para edição do famigerado decreto e que propala serem aliadas. Relativas ao nepotismo, ao assédio moral perpetrado contra os servidores mais antigos, a ocupação majoritária dos cargos comissionados (DAS) por pessoas alheias as questões indígenas e não pertencentes aos quadros da fundação.

O representante da Secretaria de Direitos Humanos responsabilizou-se em receber a comissão e cumpriu em audiência realizada na segunda feira passada na qual ficou incumbido de restabelecer o diálogo e verificar as denúncias.

Logo após, os indígenas observaram que o Sr. Mauro, representante do gabinete presidencial, encontrava-se ainda no refeitório, então a equipe dirigiu-se à mesa onde ele estava. De imediato a índia Lúcia Munduruku pediu a ele que não mais mentisse para os índios nem prometesse aquilo que não poderia cumprir.

Encerrado o diálogo com o representante do gabinete presidencial que saiu resmungando e afirmando categoricamente que o decreto jamais seria revogado ou modificado, o grupo dirigiu-se na companhia do sindicalista Chiquinho do MJ para um encontro com representantes sindicais do Ministério da Agricultura e dos Professores do DF, que ficaram encarregados de intermediar uma audiência com a Direção Nacional do Partido que encontrava-se reunida em uma das salas do Centro de Convenções. Enfim, acompanhados do Deputado Mauro Rubem, conseguimos expor aos membros presentes as críticas feitas ao decreto e a gestão do presidente Márcio Meira. Da mesma forma, a Direção comprometeu-se em estabelecer uma via de diálogo e garantir uma audiência com o ministro ou com o Presidente da República.
O Deputado Estadual Mauro Rubem participou da reunião e entregou a Direção Nacional do Partido um documento solicitando a revogação do Decreto 7056/09. Entretanto, hoje, consultando o site do partido, principalmente ao observar o álbum de fotografias do evento, surpreendentemente constatamos que em nenhuma das fotos aparecem as faixas e o grupo indígena. Todavia, o presidente Lula numa ação de marketing aparece recebendo e beijando carinhosamente as duas indiazinhas Munduruku. Sobre a carta a ele entregue nada se fala, assim como com relação ao pronunciamento que na próxima semana estaria resolvendo o assunto.

O QUE PARECER SER NÃO É O QUE É......

A Funai continua sitiada pela Força Nacional, que mantêm dois carros ostensivamente em cima do gramado. Os policiais passam o dia todo sentados atrás da portaria manipulando notebooks com acesso irrestrito a internet, conversando e às vezes cochilando, enquanto os guardas patrimoniais cobram documentos de índios que nem sempre têm carteira de identidade, tampouco sabem falar fluentemente a língua  portuguesa, proíbem o acesso de servidores das administrações extintas e de pessoas do povo que pretendem ingressar num órgão público  com as peculiaridades do órgão indigenista, num atentado ao Estado de Direito Democrático jamais visto em outros órgãos  de governo a não ser nos tempos de chumbo.

Até quando seremos desrespeitados e enganados!

Wagner Tramm
Indigenista/Geógrafo e servidor da Funai há 28 anos.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

A diferença entre a política indigenista do Brasil e a do Peru

OU:

Como o Brasil poderá um dia ser como o Peru...




Peru vende Amazônia e ameaça comunidades indígenas da fronteira com o Brasil Envie para um amigoImprimir

Em junho de 2009, no massacre de Bagua, no Peru, dezenas de indígenas foram mortos pela polícia e centenas ficaram feridos e detidos, fruto da repressão oficial, que impedia os protestos contra o decreto de implantação do Tratado de Livre Comércio com os EUA. O tratado visava o aumento do investimento de empresas em áreas ricas em recursos naturais. O descaso com o meio ambiente e seus habitantes e a criminalização do movimento indígena refletem a política neoliberal do Peru, que cede terras a empresas multinacionais para a exploração de petróleo, gás, minérios e madeira.
Hoje, 49 milhões de hectares de terras na Amazônia peruana (72% da região) estão entregues a empresas petroleiras – dentre elas à brasileira Petrobrás. São 65 lotes para exploração e produção de petróleo, muitos dos quais sobrepostos a terras indígenas e a unidades de conservação, segundo dados de 2008 da Plos One. A retirada ilegal de madeira e o tráfico de drogas se intensificam nas regiões fronteiriças do Peru, resultando em invasões de territórios protegidos no Acre, como aconteceu, anos atrás, na Terra Indígena Ashaninka do Rio Amônia e no Parque Nacional da Serra do Divisor.
Desde 2004, a Comissão Pró-Índio do Acre e a SOS Amazônia coordenam o Grupo de Trabalho para a Proteção Transfronteiriça da Serra do Divisor e Alto Juruá, grupo de instituições que debatem as questões da fronteira e os impactos sobre os povos da região. Em novembro de 2009, realizaram mais um encontro para discutir o tema, que reuniu organizações indígenas e do movimento social do Brasil, Peru e Bolívia.
Vítimas do ‘desenvolvimento’
Durante o evento, duas lideranças indígenas do Peru, da Comunidade Nativa Sawawo Hito 40, na fronteira com o Acre, relataram como a comunidade se aliou à empresa madeireira Forestal Venao, de Pucallpa, para tentar superar as dificuldades causadas pelo isolamento e o descaso do governo. Os irmãos Ashaninka, João e Luis Garcia Campos, contaram em entrevista que, em troca da retirada da madeira, a empresa prestaria serviços à comunidade, inclusive aqueles de responsabilidade do governo.
Mesmo certificado pela Smartwood-Rainforest Alliance com o selo FSC em 2007, a atividade madeireira, fundamentada em um plano de manejo elaborado pela empresa e aprovado pelo Instituto de Recursos Naturales (Inrena), resultou na abertura de uma estrada, em uma extensa rede de ramais, em grande devastação, na fuga das caças e na obstrução de cursos de água, deixando as famílias Ashaninka sem a sua principal fonte de sobrevivência: a floresta.
Este é um retrato do que acontece em regiões da Amazônia peruana. Assim como a Forestal Venao, outras empresas, dentre elas as estrangeiras, exploram recursos naturais do país e causam prejuízos ao patrimônio natural e cultural das comunidades e às suas formas de organização social e política. Em nome do desenvolvimento sustentável e do progresso, essas atividades são apoiadas por políticas favorecidas por vários órgãos do governo peruano. Nos debates oficiais, costuma-se analisar apenas o lado positivo desses processos para a economia. A mídia, por sua vez, continua a retratar os povos indígenas como atrasados ou como obstáculos ao desenvolvimento.
Integração Brasil-Peru
Nos últimos anos os governos do Brasil e do Peru têm construído processos de integração física e energética. Além da pavimentação da Rodovia Interoceânica, estão em fase de planejamento a construção de uma estrada e de uma ferrovia ligando o município de Cruzeiro do Sul a Pucalpa. Já a parceria energética visa promover a produção e exportação de energia hidrelétrica e a integração de empreendimentos de empresas estatais e privadas – brasileiras e peruanas – nas áreas de petróleo e gás.
Esses processos de integração têm sido discutidos há anos por organizações do movimento social e associações indígenas e extrativistas do Acre e Peru. Elas têm exigido que os dois governos cumpram as recomendações da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas. Essas recomendações garantem o direito das comunidades e organizações à realização de consultas, prévias, consentidas, informadas e de boa-fé, a respeito das políticas oficiais de desenvolvimento e de “integração regional” que venham a afetar seus territórios e modos de vida.
Têm também reivindicado que os governos de ambos os países implementem políticas fronteiriças comuns, voltadas à conservação do meio ambiente e da biodiversidade, à proteção de terras indígenas e unidades de conservação e à garantia de direitos dos povos indígenas, assegurando plena participação desses povos e dos demais moradores da região de fronteira na definição e execução dessas políticas.
ENTREVISTA
“O governo peruano tem contrato com empresas para a exploração de recursos naturais nas terras protegidas”, afirma liderança indígena Ashaninka do Peru
Leandro Chaves – Fale um pouco sobre a empresa Forestal Venao.
Luis Garcia e João Garcia –
 Forestal Venao é uma grande madeireira peruana. Foi ela que acabou com as madeiras da nossa aldeia. Hoje é uma empresa muito grande e só cresceu às nossas custas, porque quando a conhecemos, não tinha quase nada. Ela saiu da nossa comunidade e não nos deixou nada, nenhum recurso. Hoje ela trabalha com outras terras indígenas no Alto Juruá e está repetindo a mesma destruição que fez na nossa comunidade.
LC – O que aconteceu entre sua comunidade e a madeireira?
LG/JG –
 Nós estávamos abandonados pelo governo do Peru. Estávamos muito longe de qualquer tipo de comunicação com as instituições peruanas, inclusive as que representam os direitos das comunidades indígenas. Estávamos longe, também, das cidades e ficava difícil fazer compras. Tinha os problemas de saúde, adoecia uma pessoa e não tínhamos como sair. Sabe quanto custa um avião de Pucallpa para a nossa aldeia? 1.800 dólares para pegar um doente lá, trazer e mandar tratar na cidade. A única coisa que nos ajudaria a cobrir essa necessidade era a madeira. Esse foi o único meio que vimos para sair dessa situação. Por isso, fizemos o acordo com a empresa, em 2002. Entramos com a proposta do que a gente queria também. Faltou uma boa administração da parte deles com os mais de 4 milhões de dólares gerados dentro da nossa terra. Em 2007, começamos a perceber que isso não estava certo. Nossa madeira estava acabando e, por isso, terminamos o contrato. Agora, essa empresa não trabalha mais com a gente e nos deixou sem madeira e sem benefícios. Percebemos um pouco tarde que com a nossa madeira não poderíamos mexer. Estamos sofrendo bastante, mas tentando nos reerguer. Apanhamos, mas aprendemos.
LC – Que outros problemas vocês sofreram por causa das ações da empresa?
LG/JG –
 Sempre antes de a madeireira chegar à comunidade, ela ficava uns seis meses em Pucallpa fazendo manutenção das máquinas. Nesses meses não tínhamos muitos problemas. Mas quando as máquinas começavam a transitar pela terra, dia e noite, não encontrávamos nenhum tipo de caça. Elas corriam. Pesca nunca tivemos problemas.
LC – O que está sendo feito para reverter a situação do desmatamento na sua terra?
LG/JG –
 Começamos a fazer um plano de manejo e aprendemos a usar nossa madeira. Também estamos reflorestando. Após a saída da empresa, já plantamos mais de 85 mil árvores. Estamos sobrevivendo somente através do nosso recurso, pois continuamos abandonados pelo governo. Vamos buscar outras alternativas e maneiras de trabalhar, como o artesanato e o ecoturismo. Isso sim é uma fonte de renda que não causa problemas. Queremos também uma parceria com as comunidades do lado acreano, que possuem mais experiência, como é o caso da Apiwtxa, onde vivem muitos de nossos parentes.
LC – Vocês possuem alguma organização?
LG/JG –
 Sim, temos a UCIFP (Unión de Comunidades Indígenas Fronterizas del Perú), que abrange as comunidades Sawawo, Dorado, Santa Rosa, Nueva Shawaya e Vitória, das etnias Ashaninka, Jaminawá, Amauaca. Acontece que essa organização não funciona para a gente. Ela funciona só para as empresas. Na época da Forestal Venao, defendia mais o interesse da empresa do que o nosso. Não reclamo da organização, mas das pessoas que estão à frente dela e só vêem benefícios que não são o dos povos indígenas, que ficam no prejuízo. Quem sabe se trocasse de direção, as coisas não mudariam?
LC – Hoje vocês sofrem algum tipo de pressão por parte de outras empresas?
LG/JG –
 Sem dúvida. Nossa principal preocupação hoje é com essas companhias petroleiras que estão se aproximando da nossa comunidade. Tem uma que está com as suas bases instaladas a cerca de 80 km da nossa terra. O governo peruano tem contrato com essas empresas para explorar recursos nas terras protegidas, tudo isso sem consultar nós, que somos donos do lugar. Isso já está acontecendo, como na Forte Esperança, dos nossos parentes Ashaninka. Já não bastou a Forestal Venao e agora vêm essas petroleiras? Nossa terra vai se acabar! Sobrevivemos da mata, nossas crianças precisam dela, a nossa alimentação vem daí. Tem que haver um mínimo de respeito. A exploração já chegou à comunidade Paraíso. Eu vi muitas coisas por lá. Mexer com petróleo pode trazer consequências ruins para todo mundo. Se os canos vazarem, por exemplo, podem contaminar todos os rios, inclusive os do Acre, porque os rios correm no rumo do Brasil. Se sofremos com a retirada da madeira, pois agora é que vem o pior.
LC – A imprensa peruana tem dado alguma visibilidade à causa de vocês?
LG/JG –
 Estive um tempo em Lima e tentei informar sobre isso. Tive até a oportunidade de chegar à televisão para levar informações sobre esse problema. Os empresários, que tem dinheiro e controlam os meios de comunicação, cortaram tudo. Acabaram com a informação. Falaram: “Vocês vão acreditar nesse índio? Ele está sendo pago para fazer essa denúncia”.
LC – Qual sua opinião em relação ao mandato do atual presidente Alan Garcia?
LG/JG –
 Ele está deixando as comunidades indígenas da fronteira abandonadas e dando mais valor aos empresários, petroleiros e mineradores. Gente que já tem dinheiro o bastante. Está deixando de lado o nosso direito enquanto povos indígenas, que vivemos da floresta, e dando parte dela para pessoas que já têm como sobreviver. São empresas grandes. O governo está vendendo a Amazônia e nos tratando como animais. Tudo isso por causa de interesses econômicos. Nos sentimos vendidos, nossa opinião é essa. Gostaríamos de falar para todos o que está acontecendo para ver se gera alguma cobrança. O Peru precisa saber do sofrimento que estamos passando por culpa dele mesmo. Muita gente nem sabe que existimos, mas estamos aí. Agora, graças a Deus tivemos essa oportunidade de estar aqui com vocês, em Rio Branco, discutindo esses problemas e compartilhando ideias. Por que não agir como o governo brasileiro, que mostra preocupação com as suas florestas? É isso que queremos.
LC – E a partir daqui? O que esperar para o futuro?
LG/JG –
 Nós temos que pensar somente em ir em frente e buscar os nossos direitos. Em relação à madeira, nossa situação melhorou com a saída da empresa e o começo do reflorestamento. Agora é só ver como vamos trabalhar. Ainda queremos indenização da Forestal Venao. Aprendemos com o que aconteceu e estamos retomando. Vamos reclamar ao governo peruano, pois as coisas não estão claras e não foram cumpridas como estavam no contrato. Nossa comunidade ainda está abandonada pelas autoridades. Tem o IBC [Instituto Bien Común] lutando pelos direitos indígenas, mas no geral não há o mesmo tipo de organização que existe no Brasil. Só sei que várias pessoas querem viver às custas das comunidades indígenas e no final não nos deixam nada. É necessário mudar essas ideias para que possamos ter melhores expectativas para o futuro. Pobres nós não somos porque temos toda a natureza.
(Por Leandro Chaves, Comissão Pró-Índio do Acre CPI/AC, EcoDebate, 24/02/2010)

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Blefe, blofe e blufe na Funai


As coisas estão confusas na questão indígena brasileira. Muita indecisão, muita boataria, muita vontade de manter poder. Muito nervosismo na Funai e no meio indigenista e indígena.  De um lado a Rádio Nacional da Amazônia transmite uma fácil notícia de que a Funai está sob controle e que os índios pouco a pouco estão entendendo os objetivos supremos do decreto de reestruturação.


Inclusive que o presidente Lula estaria de acordo com esses objetivos.

De outro, estão os representantes dos fazendeiros ansiosos por encontrar uma solução para a questão fundiária dos índios Terena e Guarani do Mato Grosso do Sul.

Aí estão essas notícias, para o quê elas puderem valer.

_____________________


Índios chegam a acordo com a Funai sobre funcionamento de posto do órgão em Altamira


Leandro Martins
Repórter Rádio Nacional da Amazônia
Brasília - Terminou em acordo a reunião entre as lideranças indígenas do Pará e o presidente da Funai, Márcio Meira, realizada hoje (23) no Ministério da Justiça, em Brasília. O encontro entre 15 representantes indígenas de Altamira, no Pará, e o presidente da Funai discutiu o Decreto 7.056, assinado em dezembro de 2009, que prevê a reestruturação da Funai.
De acordo com o presidente do Conselho Indígena de Altamira, Luís Xipáia, os indígenas temiam pelo fechamento do posto que a Funai mantém na região, mas a conversa com Meira tranquilizou os líderes. “Ela foi positiva e bastante clara para nós, e no dia 9 de março vão descer as lideranças de todos os povos para discutir com o presidente da Funai, em Altamira, o funcionamento [do posto]”, disse Xipáia.
Em entrevista hoje ao programa Amazônia Brasileira da Rádio Nacional da Amazônia, Márcio Meira afirmou que o decreto teve o apoio das principais organizações indígenas (Coiab, Apoinme, Foirn, Apipan e Cir), e que não será modificado e muito menos extinto. Segundo ele, não é possível a aprovação de todos os 225 povos indígenas do país. De acordo com Meira, a Funai está esclarecendo os detalhes do decreto que estavam gerando dúvidas.
Ele informou que um concurso público, com provas marcadas para o dia 14 de março, vai permitir a contratação de 3.100 funcionários para a Funai até 2012. Segundo Meira, a medida vai corrigir as distorções como a manutenção de mais de 60 coordenações regionais no país, ou seja, acima de duas para cada um dos 27 estados brasileiros.
Meira ressaltou que o decreto prevê a participação de representantes das comunidades indígenas na gestão da fundação. “O decreto inclusive inclui dentro da gestão da Funai, a prática de participação direta das comunidades indígenas na gestão da Funai, quando nós criamos em cada regional um comitê participativo da gestão”.
Ontem (22), foi apresentado à Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados, o Projeto de Decreto Legislativo nº 2.393, de autoria do Deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR). O projeto pede o cancelamento do Decreto 7.056, que trata da reestruturação da Funai.
No projeto, o autor argumenta que o decreto da Funai fere os termos da Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que diz, em seu Artigo 6º, que há necessidade de consulta prévia aos povos indígenas interessados acerca de alterações na estrutura administrativa dos órgãos responsáveis pelas políticas e programas que lhes são concernentes.
________________________

O anúncio de que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pediu para a bancada federal auxiliá-lo a encontrar as áreas em disputa entre índios e fazendeiros para que a União compre e ponha fim a um problema histórico em Mato Grosso do Sul já começa a movimentar os setores indigenista e político.

Segundo o assessor jurídico do Cimi (Conselho Indigenista Missionário), Rogério Batalha, diante de um cenário de boa vontade política, é preciso priorizar os indígenas que vivem em terras já demarcadas.

Ele cita as terras guarani Yvi Katu, em Japorã, Ñderu Marangatu, em Antônio João, Sombrerito, em Sete Quedas, Taquara, na cidade de Juti e ainda, as onde vivem os terenas: Cachoeirinha [Miranda] e Buriti [Em Dois Irmãos do Buriti].

“Para os povos indígenas, não basta entregar qualquer terra. Mesmo que não se resolva a totalidade da demanda, entendo que algumas terras já identificadas [as citadas acima] poderão ser encaminhadas esse ano e isso destensionaria o conflito no Estado”, frisa Batalha.

“Tem todas as condições de resolver a situação se existir vontade política de se encaminhar isso ainda este ano”, completa. Batalha explica que o Cimi defende a criação de emenda do governo estadual para criar o fundo da terra e assim, o Estado possa receber os recursos da União para a indenização dos fazendeiros.

Lula quer criar mecanismos jurídicos para driblar a Constituição, pois não é autorizada a compra de terras indígenas, e assim, por fim aos conflitos e risco de violência em Mato Grosso do Sul, onde vivem 40 mil índios.
Já o deputado estadual Pedro Kemp (PT), atuante na questão indígena, defende a solução para o problema, mas vê com ressalvas a proposta do correligionário, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

“A parte interessada, os índios, não estão sendo inseridos no debate. Os deputados [Vander Loubet (PT) e Dagoberto Nogueira (PDT)] discutiram somente com os ruralistas, só eles foram consultados. Isso não é simples. Tem que ver quais são e onde estão as terras que os índios precisam”, frisa Kemp.

O governista Youssif Domingos (PMDB) elogiou a estratégia do presidente Lula e disse que a medida vai ‘minar os conflitos em Mato Grosso do Sul’

sábado, 20 de fevereiro de 2010

Índios petistas pedem mudança da Funai no 4º Congresso do PT


O 4º Congresso do PT se realizou nesses últimos três dias em Brasília, quando foram eleitos o novo presidente, o carioca-sergipano José Eduardo Dutra, e o novo Diretório Nacional de 81 membros com seus diretores e secretários. Todo esse evento está documentado no site do PT.

O auge do Congresso se deu neste sábado quando foi aclamada a ministra Dilma Rousseff como pré-candidata do PT para a presidência da República.

Nessa ocasião a ministra Dilma proferiu um equilibrado e sensível discurso, com citações dos poetas Carlos Drummond de Andrade e Mário Quintana, no qual prometeu lutar pela continuidade do projeto de desenvolvimento econômico com progresso social para o Brasil, aperfeiçoando e avançando em programas sociais e educacionais. Sem esquecer de citar os índios como parte do seu projeto de participação. Um belo e bem feito discurso, digno não só da tradição petista, mas, ouso dizer, da tradição getulista e brizolista, com verve e retórica poética de Darcy Ribeiro. Fiquei muito impressionado.

Como sempre, o Pres. Lula fez um discurso vigoroso, ao seu estilo, sem titubear, e demonstrando confiança de que, com a ajuda dos aliados, elegerá a ministra Dilma como sua sucessora.

Para a questão indígena brasileira atual o interessante foi a participação de um grupo de índios petistas, alguns dos quais tendo vindo como delegados de suas bases em seus municípios. Eles entraram no auditório e abriram duas grandes faixas com dizeres contra o decreto de reestruturação da Funai e pedindo a saída da cúpula da Funai, faixas estas posicionadas no palco em frente de 2.000 delegados, da imprensa, dos ministros da República e de todas as autoridades brasileiras e estrangeiras presentes.

Quando o Pres. Lula estava fazendo seu discurso, em dado momento foi interrompido pela voz de um dos índios presentes que gritava no auditório: “Presidente, fala com o índio!!!” Com isso o auditório inteiro, com mais de 2.000 delegados ecoou:

“Fala com o índio, Presidente!! Fala com o índio!!”

Lula ouviu o clamor, interrompeu seu discurso e disse, em frente a todos: “Podem deixar, eu sei de que vocês estão falando, vamos resolver isso essa semana!”

Aí o auditório se acalmou, os índios e aquietaram e o Pres. Lula prosseguiu com seu discurso.

Que será que Lula quis dizer com “Vamos resolver isso essa semana!” Quem adivinhar pode se servir do último pedaço de pudim na geladeira!

O grupo de índios que participou desse momento ficou vibrando de emoção e de esperança de que essa semana o Lula resolva de fato essa questão.

Mas esse grupo não se deu por satisfeito e, terminado o Congresso, se dirigiu aonde estava o próprio novo presidente do partido, José Eduardo Dutra, junto com o secretário Ricardo Simões e outros e explicou com todos os detalhes o que vem acontecendo na Funai e com a questão indígena brasileira e por que eles querem com tanta veemência a saída da atual direção da Funai.

Também esse mesmo grupo conversou diretamente com outras figuras importantes do partido, em especial José Dirceu, e com a governadora do estado do Pará, Ana Júlia Carepa.

A todos o grupo indígena petista disse o seguinte:

1. que o decreto de reestruturação estava acabando com a Funai, já combalida e precisando de reforço.
2. que era ilegal por infringir a Convenção 169, da OIT, e não ter consultado os índios na sua formulação
3. que extinguira 24 AERs, sem substitui-las e deixando centenas de milhares de índios ao deus dará.
4. que a extinção dos postos indígenas estava fragilizando a própria segurança dos índios em suas terras.
5. que a Funai estava tomada por um grupo não somente autoritário, mas ditatorial, que não escutava os índios nem tampouco os indigenistas tradicionais.
6. que, para a vergonha dos índios, a Funai estava sendo guardada pela Guarda Nacional, algo inédito no período democrático brasileiro, lembrando a todos dos tempos da ditadura militar e especialmente do tempo dos coronéis.
7. que, para a vergonha do PT, esse grupo se fiava no partido para sua continuidade.
8. que pediam para levar ao Pres. Lula o pedido de revogação desse decreto e a exoneração da cúpula da Funai.

Segundo o grupo de índios petistas, os membros do Diretório Nacional lhes disseram que iriam levar a questão diretamente ao novo ministro da Justiça para tomar providências.

E, sem mais dizer, o grupo de índios petistas saiu triunfante do 4º Congresso Nacional do PT!

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Ministro Luiz Paulo Barreto tem audiência com Pres. Lula

Hoje de manhã o ministro Luiz Paulo Barreto teve sua primeira audiência com Lula, e não foi para tratar só da questão de uma possível intervenção no Distrito Federal, nem só das costumeiras prioridades da pasta da Justiça.

O tema Funai foi levantado, discutido e continua necessitado de solução. Há dois problemas sérios que o Pres. Lula conhece e que precisa dar solução. O primeiro é o decreto de reestruturação da Funai, que lhe foi colocado como a salvação do órgão e que provou ser uma desgraceira completa a toda a frágil estrutura que a Funai já tinha. O segundo é a continuidade ou não da atual direção da Funai.

Quanto ao primeiro caso, ficou evidente que as 84 novas posições de DAS, que foram pedidas pela Casa Civil ao MPOG como condição sine qua non para compor a reestruturação da Funai, na verdade,  não melhoraram a situação da estrutura da Funai em função da exorbitante e mal ajambrada extinção de 24 AERs e 9 Núcleos de Apoio, dos quais pelo menos 14 AERs não tiveram substitutos à altura. Por sua vez, a esdrúxula extinção dos postos indígenas, em nome de uma nova política indigenista que rejeita a memória e a tradição indigenista rondoniana, provocou um desarranjo emocional e político sem fim no órgão, e as consequências nefastas desse ato ainda estão por suceder.

O Pres. Lula já disse para mais de um interlocutor que está possesso com essa reestruturação. Em primeiro lugar, porque ficou evidente, e esse ponto foi realçado por diversas críticas importantes que lhe chegaram aos ouvidos, que não houve nenhuma consulta aos povos indígenas sobre os termos da reestruturação, contrariando a lei que ele mesmo sancionou em abril de 2004, qual seja, a Convenção 169 da OIT. Ademais, foi-lhe dito que houvera consultas ao CNPI e que os representantes indígenas teriam reconhecido e acatado as mudanças que viriam. Porém, sobre esse ponto há controvérsias. Assim, ou é verdade que houve consultas no CNPI e essas lideranças acataram, mas elas não representam os interesses da maioria dos indígenas, o que deslegitima o CNPI, ou não é verdade que houve consultas nem ao CNPI, em cujo caso, alguém mentiu para o Pres. Lula. Qualquer hipótese só traz aborrecimento ao Presidente. Em segundo lugar, o decreto lhe parece ruim agora porque, olhando de longe, politicamente, o estrago é visível até para olhos laicos no assunto. Quatro ou cinco governadores, diversos senadores e deputados da base aliada já se manifestaram contra. Mais de 800 índios já desceram a Brasília e chegaram a tomar o órgão por 10 dias para demonstrar seu repúdio tanto ao decreto quanto a cúpula da Funai. Por sua vez, a cúpula da CNBB, o arcebispo de Goiânia, o CIMI também já manifestaram seu repúdio ao decreto, por uma razão ou outra, todas legítimas.

Como extinguir Recife, Curitiba, Goiânia, Porto Velho, São Luís, João Pessoa, só para citar as capitais?

Como extinguir Altamira, Oiapoque, Atalaia do Norte, Parintins, Itaituba -- para substitui-las por outros que ficam a centenas de quilômetros de distância, como Santarém de Altamira, Macapá de Oiapoque?

Como extinguir Redenção e criar Tucumã, trocando seis por meia dúzia, se não for para provocar?

Como arrasar com as três AERs do Paraná e criar duas no litoral sul e sudeste exclusivamente para índios Guarani-Mbyá?

Para que extinguir Tangará da Serra e criar Juína, se não havia nenhuma demanda especial no caso?

Para que extinguir Goiânia, se não para descentralizar uma tradição indigenista que vinha funcionando com grande competência?

Como extinguir São Felix do Araguaia, na beira da Ilha do Bananal, e incorporar as demandas de índios como Tapirapé e Karajá exatamente na nova coordenação criada para os índios Xavante de Maraiwatsede, particularmente os inimigos tradicionais desses últimos? É para provocar, ou não é?

Como extinguir três administrações e três núcleos dos índios Xavante (além de Goiânia, da qual eles se serviam com assiduidade e tinham confiança em sua capacidade de ação) e colocá-los todos numa só coordenação em Barra do Garças, como se o relógio da História pudesse ser voltado para trás? Os Xavante evidentemente não aceitarão isso, nem a curto prazo, nem a médio prazo. Sua ascensão política não permite que eles se curvem a determinações e decisões sobre as quais eles não foram minimamente consultados.

Para o Pres. Lula tudo isso parece mais o samba do paraense doido.

Entretanto, apesar de tudo isso, o Pres. Lula não quer ou não acha conveniente politicamente simplesmente revogar o decreto. Pelo menos não agora. Portanto, precisa dar um jeito nele, revisá-lo, talvez. Mas, como??

O problema que o Pres. Lula não vê, pelo distanciamento que tem da questão, é que não há como aconchambrar os problemas criados pelo decreto. As extinções das AERs e dos Núcleos de Apoio não foram contempladas com substitutos à altura, na maioria dos casos. Mudar algumas sedes até que pode ser, como por exemplo, esquecer Fortaleza e voltar atrás para João Pessoa. Trocar Maceió por Recife. Trocar o Litoral Sul de volta para Curitiba também seria uma opção fácil. Voltar atrás em Atalaia do Norte e esquecer Cruzeiro do Sul ou Eirunepé para ser a sede da coordenação do rio Juruá. Permanecer com o Sul da Bahia em Ilhéus ou Porto Seguro. Trocar Ji-Paraná de volta para Porto Velho. Porém, os remendos não passam desses e um ou outro mais. Os vazios ficam imensos, por todo o país.

O Pres. Lula recomenda novos estudos e novas atitudes sobre a questão do decreto. Sabe que a pressa é urgente. Não dá para ficar sofrendo desgaste por causa da questão indígena. A coisa pode sempre piorar, quando esta é a tendência, dizem os sábios políticos. Então agora o Ministério da Justiça vai ter que mandar a Funai enquadrar, reconciliar as demandas em relação ao que tem e encontrar um caminho positivo.

Eis o desafio que prende a atual direção da Funai. Ou dá ou desce. Eis seu dilema hamletiano.

As apostas estão rolando.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Carta dos Xavante entregue ao presidente Lula. APIB protesta timidamente

Eis uma das cartas entregues em Goiânia ao presidente Lula, sexta-feira p.p.

Foi escrita pelo representante de uma associação indígena de Nova Xavantina, que tem a sua própria verve e ênfase.

Não foi escrita por escribas brancos de Ongs como o foram muitas das cartas que a atual direção da Funai publicou no seu site em apoio ao decreto de reestruturação.

Aliás, sobre esses apoiamentos, basta ver que as cartas escritas por associações indígenas vindas do rio Madeira são todas da mesma lavra, contém não somente os mesmos argumentos mas quase as mesmas palavras. Que vergonha! Qual Ong fez a carta e indicou os índios para assiná-la. Qual? Ninguém sabe?

Por sua vez, o documento assinado por três das cinco associações da APIB, quais sejam, a Coiab, a Apoinme e a Arpinpan, e que está publicado no seu site, também foi escrito por pessoas que vivem de fazer esses documentos e que não têm ligação com lideranças indígenas de raiz.

O documento é anódino, burocraticamente redigido, água com açúcar, como se o problema que os índios e funcionários da Funai estão vivendo fosse uma simples questão burocrática. Não contem nenhuma indignação com o que está acontecendo por mais da metade do Brasil indígena, apenas constata o movimento indígena que ocorreu em Brasília à sua revelia. Aponta timidamente  as ilegalidades cometidas no decreto, desde a falta de consulta aos índios até a extinção de administrações e postos indígenas, Não faz nenhuma menção sobre as possíveis consequências políticas que já ocorrem e que continuarão a ocorrer por conta desse decreto e dos protestos que continuarão. Naturalmente o documento nem menciona quem é seu autor, qual seu propósito maluco e não pede a demissão da cúpula da Funai, como os demais documentos críticos o fazem.

 Segundo o que consta no Blog da APIB, a cúpula da Funai recebeu os representantes dessas associações e prometeu-lhes que iria corrigir o decreto, reconhecendo seu erro (algo que não fez em nenhum caso de comissões indígenas e indigenistas que com a cúpula estiveram recentemente), mas que não faria nada em relação ao concurso público que não traz nenhuma possibilidade dos índios aumentarem suas chances no tal concurso público.

O documento faz uma ameaça mais do que explícita no sentido de que, se o decreto não for "reformulado", ele será denunciado pela APIB na ONU. Ora, na ONU, por que não o denuncia ao Ministério Público no nosso país? À ABI, à OAB, à imprensa em geral???

Não tem mais cabimento ameaças dessa natureza. O Brasil não se importa mais com o quê alguns gatos pingados da ONU vão achar sobre esse decreto. Por aqui já esteve o relator da ONU para os direitos indígenas, escreveu relatório negativo sobre diversos aspectos da atual política indigenista e o que aconteceu? Nada. Por sua vez, está mais do que claro que o atual governo não liga a mínima para esse tipo de pressão, se não não teria prosseguido com a transposição do rio São Francisco e a licença dada pela Funai e pelo Ibama para a construção de Belo Monte.

Pelo contrário, denúncias feitas no Exterior terminam repercutindo negativamente entre as autoridades brasileiras do mais alto nível. Por exemplo, no voto do ministro do STF, Carlos Ayres Britto, sobre a homologação da T.I. Raposa Serra do Sol, ele menciona que o Brasil não deve dar ouvidos às propostas de fora porque, segundo ele, nossa política indigenista é das melhores do mundo, e não precisa de tutela internacional. Semanas antes desse voto, diversas comissões compostas de indígenas e missionários andaram pela Europa falando mal da política indigenista brasileira e conclamando os europeus para intervirem na questão indígena brasileira. Bem, no final, deu no que deu com as terríveis ressalvas contidas naquele voto do dia 19 de março de 2009.

Na verdade, nem o decreto será reformulado nem a promulgação de novo edital de concurso público será feito por promessas da atual cúpula da Funai.  Já não importa muito o que ela pensa diante dos acontecimentos gerais que atingem mais da metade dos povos indígenas diretamente e a todos indiretamente. A atual cúpula da Funai faz ouvidos de mercador para as reclamações e sugestões feitas por indigenistas e indígenas. Será impossível aconchambrar as falhas do decreto sem revogá-lo em sua totalidade. E tal coisa não será feita de boa vontade. O decreto só será revogado pela continuidade da ação política dos índios e indigenistas, inclusive junto ao novo ministro da Justiça e o presidente Lula, como já vem sendo feito.

Eles é que decidirão a revogação desse decreto e a renovação da Funai, com a pressão política e cultural dos povos indígenas e dos indigenistas.

Seria muito bom se o movimento indígena incrustado nas Ongs se desse conta de seu papel, pusesse a mão na consciência e passasse a agir de um modo incisivo e dedicado aos povos indígenas que estão em suas terras necessitando da solidariedade e da ajuda de todos.


______________________




segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Indigenista Waldira Barros fala do seu constrangimento de ser barrada na Funai

Esta semana que se passou uma comitiva de Pernambuco veio a Funai para conversar com a cúpula do órgão sobre o malfazejo decreto de reestruturação. A comissão esperava convencer a cúpula do seu erro e ajudá-la na revogação, se não revisão do mesmo.

Qual o quê!

Pernambuco e Paraíba foram os primeiros dois estados que se rebelaram contra o tal decreto. Mais de 400 índios desses dois estados estiveram em Brasília e tomaram a Funai por uma semana, na primeira quinzena de janeiro. Porém, sentindo que não conseguiriam resolver a questão de imediato e com dificuldades para permanecer em Brasília, após algumas conversas com a cúpula da Funai, terminaram voltando para suas terras, sem nenhuma promessa de revogação do decreto ou de sua revisão.

Bem, os funcionários de Recife continuaram na luta, com o apoio dos índios retornados, que, segundo o que dizem, não desistiram da luta de revogar o decreto.

Na chegada das três funcionárias ao prédio da Funai, na terça-feira passada, elas foram barradas duas vezes pela Guarda Nacional, que continua de plantão na porta da Funai não deixando ninguém entrar que não tenha um assunto direto a tratar com algum funcionário. Mesmo que essa pessoa seja funcionário do órgão, ou, ainda mais inacreditável, um índio.

Índio barrado na entrada da Funai??? Eis a situação do órgão indigenista sob a atual direção.

Waldira Barros era uma dessas três pessoas que vieram na comissão de Recife. Ela e Estela Parnes, ex-administradora da extinta AER Recife, foram barradas na portaria. Mostraram suas carteiras funcionais. Nada. Um funcionário novato, ligado à cúpula, disse: "Manda elas lerem a portaria do presidente da Funai!!" Depois de conseguir entrar, pela intervenção de um funcionário vetereno que as conhecia, as duas tiveram uma estranha conversa com uma recém-contratada funcionária que foi nomeada para o setor financeiro. Lá as duas foram destratadas e ganharam a petulante sugestão de que saíssem da Funai se não estivessem gostando do decreto.

A frase proferida pela tal funcionária lembra o tempo da ditadura militar que usava um dos slogans mais cretinos da época. Qual seja:

"Brasil: Ame-o ou deixe-o!"

A nova frase parece ser: "Decreto de reestruturação: Aceite-o ou saia da Funai!"

Isto é inaceitável moralmente e revoltante sobre qualquer ponto de vista.

Eis a mensagem enviada ao Blog via email:

________________________


Oi Mércio, 

Gostaria que este depoimento fosse lido por todos os servidores. Se ajudar de alguma coisa, para que todos levatem a cabeça e se orgulhem pelo que foi efetuado até hoje em nome dos índios.
A situação foi bastante humilhante. Convidadas pelo presidente para uma reunião, tínhamos realmente muita coisa a ser conversado e apresentado. Porém, não passamos apenas por esse.
No primeiro dia, estivemos em reunião com as coordenadoras Francisca Picanço e a Socorro Brasil. Todos sabem que não levo desaforos para casa, os problemas poderiam tirar a concentração do foco. Fomos totalmente desarmadas, pensando na situação dos índios, servidores, fornecedores e parceiros. 

Após alguns questionamentos, fui surpreendida com uma resposta atrevida da senhora Chica Picanço - “caso não concordasse com a situação, que saísse da FUNAI”.  Tentei me controlar e manter a linha, foi em vão. Respondi: “Você me tenha respeito, não sou nenhuma novata na FUNAI, tenho trabalho reconhecido nacionalmente, e mais de vinte anos de casa”. Percebi que era um amortecimento para a conversa principal. 

Se nós servidores somos tratados desse modo, coitados dos índios. Quer falta de respeito maior do que esse Decreto? Quiseram separar o trigo do joio, fala do Presidente,  porém colocaram todos no liquidificador e jogaram em um buraco de lama, qual um bandido. Esqueceram todos os trabalhos realizados, será que valeu a pena tanto esforço e trabalho fora do horário? A punição foi na mesma proporção. E olha que não estamos brigando por DAS e sim por uma explicação e um entendimento. 
Fiquei triste, quase não se vê na instituição os nossos colegas de trabalho. Senti-me uma estranha na minha própria casa. Esse fato ocorrido na portaria, na frente de colegas, o constrangimento foi maior somando aos demais expectadores - seguranças e policial da Força Nacional. Naquela hora tive dúvidas se valia a pena tudo aquilo, o estrago já estava feito. 

Não bastando, no outro dia, ocorreu de novo o fato, desta vez, sem justificativa, estávamos em horário de expediente. Ao sair de Recife, esperava no mínimo respeito enquanto servidora. Ao mostrar a carteira funcional o descaso foi tanto que senti vergonha de entrar na instituição. Tive vontade de voltar para minha terra, sem falar com ninguém. Porém, em respeito aos colegas que estavam comigo, continuei firme e indo mais longe, pensei nos índios, nos servidores, fornecedores e parceiros que aguardavam um resultado. 

Obriguei-me a seguir em frente. E acho que fizemos e adotamos as providências corretas. Entramos com uma representação. Apesar de achar que não vai dar em nada. As coisas foram longe demais, perdi a alegria no trabalho, a paixão pelo êxito, nada disso foi levado em consideração. Senti-me uma bandida, vagabunda, cadela sarnenta. A que ponto tivemos que descer para subir um elevador para não perder a oportunidade de brigar por um ideal e idéias. Chorei muito, aquele choro silencioso, sei que cada uma de nós fez isso, para não desanimar a outra. 

Agora, ao escrever este depoimento, estou chorando de verdade e sem medo de me expor.  Quem tem valor hoje é quem não entende de índio, nós somos meros gagás. Acredito que nossas considerações e indagações de nada valeram. Eles estão tão certos que nossa opinião nada vale. Isso dói e como dói. É simplesmente dilacerante.  Os índios, como  o Presidente afirma, a nível nacional,  já estão conformados e orientados. Queira a Deus que isso não resulte em algo mais grave. Foram tão deprimentes as situações, que preferia não terem sido divulgadas, até mesmo para evitar reações dos indígenas que nos conhecem, porém inevitável, na frente de tanta gente, não passaria despercebida. 

Obrigada CHICO e JANICE que tentaram a todo custo contornar e amenizar a situação. Sei que o constrangimento também atingiu vocês, como a outros servidores que tomaram conhecimento. Foi pior do que uma tapa no rosto. Levantei-me e continuarei na luta sim, agora mais do que nunca. Por mim e em nome e respeito aos demais colegas e aos índios. Obrigada, amigos, pelo apoio, confesso que estava precisando disso. 

E que isso sirva de estímulo para que outros não baixem a cabeça. Vamos nos fazer escutar. Pode até não dar resultado, porém tenho certeza que incomodaremos. Fui de braços e mentes abertos e, literalmente, voltei com eles cruzados. Desculpem os erros, ainda estou vazia de sentimentos e de conhecimentos, imaginem de uma boa escrita e concordância. Porém o desabafo serviu para que minha adrenalina voltasse e com força total. 

Estou nesta servidores! Levantem a cabeça, sacudam a poeira e deem à volta por cima. Esse é o lema. Não vamos baixar a cabeça JAMAIS. 
Waldira Maria de Barros
Téc. Com. Social
Extinta AER-Recife

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Beth Begonha entrevista Megaron sobre Belo Monte e reestruturação da Funai

Numa entrevista clara e informativa a jornalista Beth Begonha, da Rádio Nacional, entrevista Megaron-ti Metuktire, um dos grandes líderes indígenas brasileiros e também administrador da AER Colíder.


Acesse a entrevista nos endereços abaixo:


http://bethbegonha.podOmatic.com/entry/2010-02-13T12_26_02-08_00


http://bethbegonha.podomatic.com/player/web/2010-02-13T12_26_02-08_00

Presidente Lula recebe documentos dos índios em Goiânia

O presidente Lula recebeu ontem novo documento pedindo a revogação do decreto de reestruturação da Funai.

Foi uma festa só.

Veja a foto de Arnaldo Tsererõ com o presidente, que segura a mão de outro índio Xavante.

Que será que o presidente vai dizer agora?

Foto Pádua

PÓS-ESCRITO

Arnaldo Tsererõ relatou a conversa com Lula e como chegou no palanque do presidente na sexta-feira, em Goiânia. Disse que foi levado por um deputado federal que tinha sido amigo de Mário Juruna, o grande cacique Xavante e deputado federal pelo Rio de Janeiro.

Lula foi receptivo à fala de Arnaldo, bem como às falas dos bispos Dom Tomás Balduino e Dom Washington Cruz, arcebispo de Goiânia, sobre a revogação do decreto.

No final, Lula garantiu a Arnaldo que iria tratar desse assunto com o ministro da Justiça Luiz Paulo Barreto.

Vamos ver o que se passará no fim do Carnaval.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Arcebispo de Goiânia, Dom Tomás Balduino e Iris Rezende pedem a Lula revogação do decreto de reestruturação da Funai

Em carta enviada dia 10/02, Dom Tomás Balduino escreve ao Presidente Lula pedindo que ele revogue ou revise o decreto de reestruturação por duas razões:

1. Infringe a Convenção 169 da OIT, que foi declarada lei brasileira pelo Congresso Nacional e sancionada pelo próprio presidente, em 19 de abril de 2004, por não ter feito consultas claras aos índios e recebido o seu livre consentimento em questões que os afetam diretamente.

2. Extingue entre outras tantas administrações da Funai, a AER Goiânia, considerada, nas palavras do próprio Dom Tomás, de importância estratégico-geográfica e com quadros dos mais competentes do órgão.

Concordo com os dois motivos. Há outros mais, mas esses são suficientes para Dom Tomás, Dom Washington Cruz e o prefeito Iris Rezende (que já foi governador, senador e ministro da Justiça).

Logo mais pela manhã o Presidente Lula estará em Goiânia inaugurando e prestigiando políticos, junto com Dilma Rousseff, e será recebido por essas autoridades e por uma comitiva de índios de várias partes de Goiás e de Mato Grosso. Como em Recife, ele verá a infelicidade e revolta dos índios contra o decreto que inadvertidamente assinou a pedido da cúpula da Funai.

Será que já chega, Presidente?





quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Índios do Xingu se unem em Altamira e protestam contra decreto da Funai

Os povos indígenas que vivem na região de Altamira --Xipaya, Kuruaya, Juruna, Arara do Maia, Arara, Assurini, Kayapó Kararaô, Araweté, Parakanã e Xikrin-- uniram-se em prol da permanência da AER Altamira e portanto contra o decreto de reestruturação da Funai.

Mais de 150 índios, vindo de barco, aportaram em Altamira, tomaram a sede da Funai local, tomaram a sede do campus avançado da UFPA e exigiram da Funai o fim do decreto.

Ontem 20 deles começaram sua viagem para Brasília. Acham que vão convencer a cúpula da Funai a mudar o decreto e contemplar Altamira. Qual o que! Vão ouvir o mesmo que outros grupos indígenas já ouviram: que o decreto é muito bom, que vai aproximar a Funai dos índios, que o fim dos postos indígenas é só para criar coordenações técnicas locais, que a questão da unidade gestora não é problema, que Santarém vai ser uma maravilha, e tal.

A cúpula da Funai está tomada por psicose narcísica pela qual só ela sabe o que faz, só ela tem clareza sobre as coisas boas que o decreto vai propiciar. Mais parece o bunker de Hitler nos últimos dias de março de 1945 enviando ordens para seus generais que a coisa a fazer era resistir e levantar o ânimo do povo alemão pela palavra salvadora que barraria a entrada do Exército Vermelho.

Não há outra analogia para o que está acontecendo na Funai. O rescaldo desse desastre vai ser arrastado e custoso. Tal como em 2003.

Os índios de Altamira sabem a boca quente que vem por aí. Madeireiros vão se aproveitar desse vazio administrativo, dessa irresponsabilidade e vão entrar em terras indígenas. O ISA e o CTI vão estar em Altamira para olhar pelos índios !! Eis a questão!


quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Índios Xokleng em 1927

Em 1927 o alemão Gunther Plüschow fez uma viagem à Patagônia, mas antes passou pela região de Blumenau, onde viviam os índios Xokleng, então chamados de Botocudos. Pluschow filmou uma colônia alemã que estava se instalando naquelas terras e filmou também um grupo de Xokleng que vivia por lá.


O filme é mudo, naturalmente, e as legendas vêm em alemão. Numa delas fala num grande paredão de floresta que esconde o lugar onde vivem os "últimos" índios Botocudos.


Os atuais Xokleng podem ver esse filme e tentar verificar onde foi filmado. A cena das jovens mulheres com seus filhos preparando o almoço é muito cândida. Evidentemente todo mundo está bem nutrido e as jovens são bonitas e alegres. Na cena inicial um grupo de cinco homens surge do alto de um morro, como numa tomada fordiana, e mira um boi disparando pela ravina, Em seguida o boi aparece deitado, se debatendo com uma flechada no flanco. Depois é esquartejado. Só aparecem jovens, o que provavelmente significa que as cenas foram produzidas fora da aldeia.


O filme foi remasterizado e ficou com ótima qualidade. Aproveitem!


Índios de Manaus revertem demissão de Edgar Fernandes


Os índios de Manaus, que tomaram a sede da AER Manaus na segunda-feira, conseguiram reverter uma das primeiras medidas do decreto de reestruturação, a demissão do administrador Edgar Fernandes da AER Manaus. Edgar foi pego de surpresa com sua exoneração, quando estava de férias. Como tantos outros, sem dúvida.


Mas os índios de Manaus reagiram.

Essa é a primeira vitória, pequena ainda, do movimento indígena contra o decreto e suas consequências. Agora vamos ver o que a cúpula da Funai vai fazer com o tal Pedro Paulo Ramos, um administrador sem nenhuma experiência indigenista, indicado por ser político, que ficava na AER Parintins, a qual foi extinta. Por certo lhe darão uma coordenação técnica local para não ficar sem emprego.

Enquanto isso, os índios Mura, Sataré Maué e os que vivem na região do Trombetas Mapuera vão protestar pela recuperação de sua AER.

Segundo a matéria da Agência Folha, houve também protestos em diversas cidades do Amazonas que não tem sido divulgados pela mídia.


_______________________________


Após protestos, Funai mantém índio como coordenador regional



KÁTIA BRASIL

da Agência Folha, em Manaus

Após protestos em seis cidades do Amazonas, a presidência da Funai resolveu manter no cargo de coordenador regional de Manaus, o índio da etnia baré Edgar Fernandes, que havia sido exonerado com a reestruturação do órgão.

Com o anúncio, os índios que mantinham invadida desde segunda-feira a sede da Funai em Manaus começaram a deixar o prédio. Os líderes mura, apurinã, sateré, arara, miranha e kokama eram contrários ao novo coordenador regional, Pedro Paulo Ramos, que não é índio.

A coordenação de Manaus atende 80% dos 120 mil índios do Amazonas. "O presidente da Funai [Márcio Meira] tomou uma decisão sem consultar as lideranças", disse o tuxaua Roseno Apurinã. "Nós sabemos os nossos direitos, é por isso que ele corrigiu o erro dele."

Houve protestos também em Parintins, Autazes, Manicoré, Atalaia do Norte e Eirunepé.

Os índios dizem que o decreto 7.056, assinado no fim do ano pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, passou as representações dessas cidades para outras mais distantes, dificultando a busca de auxílios.

A reportagem não conseguiu falar com a Funai nesta quarta-feira.

Índios Xavante apelam em carta dramática a autoridades para salvar a Funai






Povos Indígenas de Altamira lançam manifesto contra decreto de reestruturação da Funai

Com dignidade e firmeza, o Movimento dos Povos Indígenas da região de Altamira vem a público se manifestar contra o decreto de reestruturação da Funai, pela exoneração da atual direção da Funai, pela continuidade da AER Altamira e por seu fortalecimento diante do perigo iminente da construção da Usina de Belo Monte.

Entre as mais absurdas medidas do tal decreto de reestruturação foi a extinção da AER Altamira, logo após a licença dada pela Funai a favor da construção de Belo Monte.

Os índios foram tomados de surpresa e sua indignação é incalculável. Organizaram-se, com muito sacrifício, já que toda a comunicação entre as aldeias e Altamira é via barco e canoas, e vieram em número expressivo, mais de 150 deles, para tomar a AER Altamira. Ontem chegaram mais 130 para engrossar suas hostes guerreiras.

Segunda-feira ampliaram seu raio de ação e tomaram o campus da UFPA, dentro do qual está a AER Altamira.

As lideranças indígenas de Altamira não abrem mão de suas reivindicações e consideram um deboche a extinção da AER Altamira e sua substituição por coordenações técnicas locais. Muito menos que venham a ser tratados por frente de proteção etnoambiental, sob o comando do CTI. Que, aliás, junto com o ISA, já fez escritório em Altamira preparando-se para assumir o controle da situação indígena na região a ser conflagrada pela futura usina hidrelétrica.

As lideranças indígenas repudiam veementente o decreto e as intenções por trás dele. De hoje para amanhã um grupo de 20 lideranças está se deslocando para Brasília para tratar com o Ministério da Justiça a reinstituição da AER Altamira e a saída da atual direção da Funai.

_____________________________________


EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DA REPÚBLICA, LUIS INÁCIO LULA DA SILVA


Com cópia para:
Presidência da FUNAI;
Ministério Público Federal em Altamira;
Ministério Público Estadual;
6ª Câmara do MPF;
Órgãos de Imprensa.


MOVIMENTO DOS POVOS INDÍGENAS DA REGIÃO DE ALTAMIRA-PA que ocupam por tempo indeterminado a sede da FUNAI em Altamira-PA, desde 04/02/10, representando o conjunto dos Povos Indígenas, através de 09 etnias locais, e mais de 4.000 indígenas, vem por meio deste, 


TORNAR PÚBLICO A INSATISFAÇÃO COM A APROVAÇÃO DO DECRETO Nº 7.056, de 28/12/10, E A EXTINÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO EXECUTIVA DE ALTAMIRA-PA pelos motivos que passa a expor para ao final exigir:


01. O Decreto foi publicado no DOU em 29/12/09, em pleno recesso legislativo.
  1. A aprovação do Decreto não obedeceu ao comando legal estabelecido na Convenção 169 da OIT, acordo internacionalo ratificado pelo Brasil mediante o Decreto nº 5.051, de 19/04/2004.
  2. Além de não ter havido consulta prévia aos Povos Indígenas, a Comissão Nacional de Política Indigenista – CNPI criada pelo próprio presidente da FUNAI PARA NOS REPRESENTAR foi completamente ignorada.
  3. A aprovação do decreto de reestruturação da FUNAI não cumpriu o disposto da Convenção 169 da OIT, gerando assim um vício que o torna nulo. Sobre esse assunto o STF já se manifestou editando o enunciado da súmula 473, que assim dispõe: “A administração pode anular seus próprios atos quando eivados de vícios que os tornem ilegais, porque deles não origina direitos; ou revogá-los por motivos de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvado, em todos os casos, a apreciação judicial”
  4. O vício do ato administrativo que o torna ilegal foi justamente a ausência de consulta prévia e informada aos Povos Indígenas do Brasil e à CNPI.
  5. O parecer 021 emitido pela própria FUNAI relativo ao componente indígena do AHE Belo Monte sugere o fortalecimento da atuação da administração local, como mitigação de impactos previstos com a implantação da hidrelétrica e não a sua extinção.
  6. O mosaico étnico cultural da região de Altamira é único e a maioria dos povos indígenas da região tem no máximo 40 anos de contato.
  7. A Administração Executiva de Altamira possui a experiência e a confiança de todos nós e tem nos atendido durante todos esses anos com prontidão em detrimento das longínquas administrações propostas para Marabá, Belém e Santarém que não sabem nada sobre nós e nosso modo de viver e por estarem tão longe geograficamente não poderão nos atender com a prontidão que precisamos e nem teremos acesso a eles como temos a Altamira.
  8. O que está por detrás da extinção da Administração Executiva de Altamira não parece ser vontade de reestruturar a FUNAI para melhorar o atendimento a nós povos indígenas da região, mas sim a necessidade limpar o terreno para a construção do AHE BELO MONTE.
  9. Transferir a Administração Executiva de Altamira para o Tapajós quando temos sérios problemas relacionados a demarcações e desintrusões de terras indígenas, quando todos ao nosso redor nos odeiam por nossa posição sempre a favor da natureza e quando será construída a maior obra do PAC em nossa região e afetará diretamente todos os povos indígenas constitui uma tentativa de genocídio para com os povos indígenas de Altamira.
Diante de toda a fundamentação fática, jurídica e de respeito a nós, EXIGIMOS:
  1. A anulação do Decreto 7.056, de 28/12/2009, por descumprimento à Convenção 169 da OIT;
  2. A exoneração do Presidente da FUNAI, Márcio Meira e sua equipe de direção;
  3. Uma nova reestruturação baseada nas especificidades de cada região garantindo-se a participação indígena local no processo;
  4. O fortalecimento da Administração Executiva Regional de Altamira com a manutenção dos funcionários atuais e um incremento no quadro de pessoal e não sua extinção.
Diante do exposto asseveramos ainda que repudiamos a oferta de cargos na FUNAI ou em outros órgãos do governo como forma de suborno ou para prejudicar as negociações com o movimento e em hipótese alguma aceitaremos o fim da Administração Executiva de Altamira nesse momento crucial de nossa história onde nos sentimos abandonados por nosso país.


Não obstante estamos abertos a negociar desde que observadas as considerações aqui expostas.
Altamira (PA), 05 de Fevereiro de 2010.


POVOS INDÍGENAS XIPAIA, CURUAIA, XIKRIN DO BACAJÁ, PARAKANÃ, ARARA, ARAWETE, ASURINI DO XINGU, JURUNA e KAYAPÓ KARARAÔ.

Indigenista Wagner Tramm relata reunião e tece novas considerações sobre a Funai


Caros amigos,
 
Sebastião Noleto é Engenheiro Ambiental, mestre em  gestão de resíduos sólidos pela UFTO, selecionado pelo Conselho Interinstitucional Gestor do Programa de Compensação Ambiental Xerente para exercer a função de  Coordenador de Meio Ambiente do  Procambix. Contratado pelo convênio firmado entre a Funai e a Associação Indígena Akwen em 2004. Um jovem, na época, recém saído da academia, que foi contaminado pela mosca do indigenismo, como dizemos ao ver alguém  que se apaixona e se dedica à causa indígena. Responsável  juntamente com os Chefe dos Postos Indígenas : Funil, Rio Sono, Brupré, Brejo Cumprido e  Xerente, com a  participação ativa dos  Agentes Ambientais indígenas e Técnicos Agrícolas Akwen, pela condução dos projetos de viveiros de mudas silvestres, frutíferas e de múltiplo uso que resultaram no plantio de quase 100.000 (cem mil) árvores  nas áreas degradas das Terras Indígenas Xerente e Funil no Estado do Tocantins. Pela redução  comprovada pelo Ibama dos índices de queimadas naquele Estado. Pela realização da feira de sementes Akwen publicada no programa Globo Rural, pela atuação das brigadas de controle a incêndios florestais, pelas atividades de Educação Ambiental e outras desenvolvida pelo Procambix, numa proposta de Gestão Compartilhada protagonizada pelos índios Akwen com recursos alocados pela Compensação Ambiental decorrente da implantação e operação da Usina Hidroéletrica Luis Eduardo Magalhães no rio Tocantins. 

É um exemplo da necessidade do Estado brasileiro de formar recursos humanos capazes de auxiliar e assesorar  os grupos étnicos na  árdua convivência com uma sociedade que embora originária destes, mantém estereótipos, preconceitos e dificuldades de entender a alteridade propícia à construção de um  Estado Nação pluriétnico, de convívio fraterno. Ou melhor, de um Brasil de Todos! Diferente do mundo dito desenvolvido, da Europa das guerras étnicas e dos conflitos entre povos cujas visões de mundo têm particularidades propicias à manutenção do ser humano no planeta, ou na nave Terra que é um ponto quase que insignificante no plano universal.

Hoje, ao participar em conjunto com representantes das étnias Kaingangue e Guarani do Sul do País, da Apsul, da Consesef, do Sindsep-DF, de uma reunião na sede do Partido dos Trabalhadores-PT, em especial  na Secretaria de Movimentos Populares para solicitar a saída do presidente Márcio Meira e a revogação do nefasto Decreto Presidencial 7056/09, tive o prazer de  ouvir da representante da Apsul, Rosane kaingangue e das lideranças indigenas presentes que o Chefe de Posto Indígena é o Agente do Estado brasileiro nos rincões do território nacional que sabe quem são os índios, como vivem, que contribui na proteção das Terras Indígenas e goza da confiança daqueles povos no intermédio e na mediação das relações estabelecidas com o restante do povo brasileiro e suas instituições. Portanto, figura chave na consolidação do almejado Estado de Direito Democrático. Lá nos ermos do nosso território, onde poucos vão, senão movidos por interesses incompatívéis com a nossa soberania, está, ou estava presente, até a publicação do citado Decreto, um Agente do Estado: o Chefe de Posto Indígena idealizado pelo Marechal Cãndido Mariano Rondon, estribado em  um compromisso republicano que reconhece o povo indígena com um dos formadores do povo brasileiro, figura essencial na construção do Estado Nação brasileiro!

Agora os povos indígenas estão abandonados a própria sorte, a mercê dos interesses dos fazendeiros, dos madeireiros,dos garimpeiros e outros grupos economicamente hegemónicos que os vêem sempre como um empecilho para o progresso e jamais como parceiros do desenvolvimento nacional.

Durante a reunião posicionando-me como servidor do quadro da Fundação Nacional do Índio, manifestei minha indignação pela publicação desse Decreto que considero etnocida, elaborado a revelia do que preceitua a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho-OIT, da qual o Brasil é signatário;  isento da participação dos servidores da Funai e de segmentos da sociedade civil organizada conforme deve ser em um Estado Democrático que continuamos sonhando!

Na oportunidade, alertei ao Secretário de Movimentos Populares do Partido dos Trabalhadores, Sr. Renato Simões, que o governo federal e a gestão Márcio Meira, em função do Decreto, tornar-se-iam responsáveis pelos desdobramentos do tal Decreto e da Medida Provisória correlata, principalmente pela ocorrência de inúmeros e sucessiveis conflitos de ordem interétnicas e interinstitucionais de nível local e regional como os que já estamos vendo nos noticiários jornalísticos, apesar do evidente boicote empreendido pela grande imprensa.

Salientei ainda que não somos contra a Reestruturação do órgão indigenista. Pelo contrário, reconhecemos tal necessidade. Entretanto, verificamos que tal proposta representa o desmonte da fundação destinada a atender os povos indígenas. Centraliza em Brasília a máquina administrativa ao invés de fortalecer a base e/ou as atividades fins, acaba com os PIN'S. Não prevê recursos para as modificações administrativas e de infra-estrutura, não dispõe de critérios, nem se qualifica com uma construção coletiva. É um "impensado" ato deliberado de cima para baixo! 

Sérgio Ronaldo, representante da Condesef, esclareceu ao secretario a necessidade de estabelecimento de um diálogo com o governo federal. Alertou que os índios não estão sendo aliciados nem tampouco influenciados por servidores, sindicalistas e simpatizantes. O fato é que o decreto não é uma obra coletiva, não conta com a simpatia dos assistidos, assim como com a aquiescência daqueles encarregados de desenvolver a atividade estatal de proteger e assistir os índios brasileiros. 

O representante da Condesef frisou também que lamentavelmente o decreto e a medida provisória publicada logo em seguida permitem ao presidente da Funai redistribuir servidores do quadro  da Funai e receber servidores de outros órgãos, numa clara manifestação de substituição dos servidores qualificados por servidores que não detém o know how indigenista.
 
Sérgio Ronaldo colocou para o secretario que a Condesef está afinada com o movimento indígena e com a posição dos servidores. Manifestou repúdio a presença da Força Nacional na sede da Funai, impedindo o acesso de indígenas e de pessoas do povo, citando inclusive que ele próprio havia sido impedido de ingressar naquele órgão público.

Dentre outras coisas, Rosane falou ainda que os índios  do Sul foram recebidos pelos ministros das Cidades, da Pesca e da Cultura, mas não conseguem uma audiência com o Ministro da Justiça  para tratar da gestão Márcio Meira e da Revogação do Decreto. Rosane atentou também para o fato de que são os índios  que definem o resultado das eleições em grande parte dos municípios. Portanto, não é coerente a adoção de uma medida que os prejudica sobremaneira suprimindo direitos e conquistas.   

Estavam presentes, além do secretário, Rosane Kaingangue, lideranças indígenas do sul do país, Tereza do Sindesep, Sérgio Ronaldo e Othon da Condesef. Na sequência deveriam se manifestar Tereza, Othon e líderes Kaingangue, Guarani e outros.

O secretário informou na reunião que o representante do Núcleo Setorial Indígena do Partido dos Trabalhadores, Frederico Magalhães, não havia comparecido aquela reunião devido as atividades preparatórias à visita do presidente Lula no estado de Roraima da qual estava encarregado. Estava se deslocando de Brasília para Roraima....

Devo ter esquecido de relatar outros pronunciamentos, mas espero ter passado aos companheiros os fatos que tenho acompanhado na luta pela revogação do Decreto e por uma salutar mudança na gestão da Funai.

Finalmente, presto aqui, para saudar o amigo Sebastião Nokró, uma homenagem aos indigenistas que contribuíram na elaboração, acompanhamento e execução  do Procambix: Glênio Alvarez, Wagner Senna, Rogério Eustáquio, Inês Caribé, Niviene Maciel, Edson Beiriz, Ediana Barreto, Regina Célia, Lídio José, Adriano Leite, Antenor Bastos, Renato Sanches, ao pessoal da Administração Regional de Gurupi e todos aqueles que falham-me na memória, mas integraram a equipe interinstitucional, interétnica responsável pela elaboração e condução do  do citado Programa. 

As ações do referido programa foram executadas pelos próprios índios través de um convênio com a Funai, fato esse que demonstra que não somos simplesmente contrários a atuação do terceiro setor ou do estabelecimento de parcerias. Somos contra aos convênios firmados sem critérios  com as grandes organizações, as ONGs, dos amigos, dos parentes, ou aquelas que mais pretendem defender nicho de mercado e priorizar a contratação de consultorias com pouco ou quase nenhum retorno efetivo para os povos indígenas. A Funai, conforme preconizado em seus Estatutos, deve preparar os índios para a autogestão de seus problemas. Para tanto, deve, antes de mais nada, adotar a filosofia do apreender-fazendo valorizando o estabelecimento de parcerias com as organizações indígenas. O que não tem sido o caso dessa famigerada gestão anti indígena....

O autoritarismo e o totalitarismo não pode ser a  melhor estratégia. Pois já disseram que tudo que é sólido se desmancha no ar, tal qual a empáfia, a arrogância e a truculência de Márcio Meira na Funai.

Portanto: 
"Ousa lutar . 
Ousa vencer!"  
 
Titânicamente, o  indigenismo não morre
 
Abs 
 
Wagner Tramm 
 
Share