segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Antropólogo discute Raposa Serra do Sol -- 1

Esses dias estou passando férias na praia, com dificuldades para acessar a Internet. Não estou reclamando. De modo que não tenho acompanhado as notícias sobre questões de Antropologia e Índios.

Hoje tive uma chance e li que alguns indigenistas haviam feito ressalvas às ressalvas dos ministros do STF. Recebi um comentário do antropólogo e indigenista Artur Mendes, da FUNAI, mencionando a vitória da reafirmação da homologação da Raposa Serra do Sol, lembrando meu papel durante o tempo que o presidente Lula precisou para tomar sua decisão, e sugerindo que eu talvez não estivesse tão feliz com o resultado.

Seu comentário está publicado, com meu comentário em seguida. Outros que quiserem fazer comentários com história de Raposa Serra do Sol ou sobre as possíveis consequências das ressalvas dos ministros do STF, fiquem à vontade que as publicarei na postagem principal com muito gosto.

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Prezado Mércio,
Entendo suas preocupações frente aos 18 pontos apresentados pelo STF como condições para o exercício da posse indígena em Raposa Serrra do Sol.

Entretanto, julgo que isso não retira nem diminui a importância da vitória obtida pelos índios e pelo indigenismo "rondoniano". Me veio a lembrança histórica de um Alípio Bandeira e sua luta desigual, sem o amparo de uma lei que pudesse ser invocada em defesa dos índios nas primeiras décadas do século passado. Ver hoje a corte suprema reconhecer e reafirmar os direitos indígenas sobre suas terras, contra todos os interesses da cobiça, nos faz meditar a respeito do quanto se avançou no Brasil nessa matéria.

Mas me fez também lembrar da firmesa e da altivez com que você a defendeu em todas as arenas quando presidia a FUNAI, contra todos os que, tanto da esquerda como da direita, procuravam solapá-la. E não foram poucos. Não menospreze a vitória que é também sua. Parabéns mais do que merecidos a você também pelo êxito que, se não é completo, é apenas para nos lembrar que a luta continua.

Li e reli uma dezena de vezes as tais condições e, ao final, percebi que não há nelas tantos recuos como à primeira vista parecem conter. De todo modo elas ainda serão objeto de discussão e poderão ser modificadas, o que não acontecerá com o reconhecimento da posse indígena.

Um abraço,
Artur Mendes

11 de Dezembro de 2008 23:25


Mércio P. Gomes disse...
Caro Artur, Muito bom que você tenha vindo ao meu Blog para ajudar a clarificar a questão de Raposa Serra do Sol.

Agradeço-lhe por lembrar minha luta naquela ocasião. Luta que também foi sua, com toda a habilidade de enviar uma equipe a Roraima com rapidez para que pudéssemos fazer a demarcação in situ das mudanças contidas na portaria de demarcação do ministro e depois no decreto presidencial de homologação.

Por tudo isso e mais a continuidade dessa luta, estamos todos honrados e felizes com a votação feita pelos ministros. Disse-o naquela ocasião e repeti-o nesse Blog que essa homologação constitui a consagração do indigenismo brasileiro. Rondoniano, sim, sem aspas, porque não há outro que se preste a essa honraria.

Sinto apenas que essa decisão veio acompanhada de restrições não propriamente à RSS (exceto na parte do Parque Nacional de Monte Roraima e na administração do Instituto Chico Mendes, e não da FUNAI), mas ao indigenismo brasileiro.

Uma relativização explícita do direito indígena em relação a outros direitos me pareceu desnecessário, e só aconteceu para realçar uma atitude negativa.

Não ser mais necessário pedir o consentimento dos índios (nem da FUNAI) para se entrar em terras indígenas; nem tampouco para se fazer pesquisas quanto aos recursos hídricos e minerais -- me pareceu até, diria, inconstitucional, se não fosse pronunciado pelo próprio STF!

Demarcar terras com a presença explícita de municípios e estados -- você sabe -- será dificílimo para não dizer impossível nesse clima de hostilidade que a atual gestão da FUNAI estabeleceu.

Eis o meu caveat. Ainda cheio de esperanças porque as coisas poderão mudar em princípio. Mas as dificuldades aumentaram imensamente.

Com um abraço,
Mercio

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